Mesmo bem vista pelos consumidores, a sustentabilidade ainda não é um caminho tão fácil para os produtores, como afirmou o estilista ecológico Júlio Cesar, em entrevista realizada em maio deste ano. Entre outros obstáculos, existe dificuldade para encontrar uma boa variedade de materias sustentáveis, mas este problema pode ser atenuado devido à recente criação de uma modelo.
A norte-americana Summer Rayne Oakes deixou temporariamente as passarelas e a TV para aliar suas competências de designer de calçados, autora de livro sobre moda ecológica e empreendedora social na criação do site Source4Style. Neste endereço, estão reunidas inúmeras matérias-primas sustentáveis. Segundo Oakes, este canal segmentado de venda não resulta apenas na preservação do meio ambiente, mas dá mais tempo para os criadores desenvolverem a estética de coleções. "Uma pesquisa nossa constatou que 85% do tempo de produção dos designers ecológicos é gasto com pesquisa de materiais", sustenta.
Outra missão do projeto, que ainda está em versão beta, é facilitar a comunicação de designers e varejistas com grupos de artesãos e cooperativas menos expressivas. Até o momento, quem quer conferir a novidade precisa se cadastrar e aguardar convite.
Nascido em Mossoró (RN), Júlio César foi o 1º estilista a utilizar o Sonic Fabric, tecido feito com fita cassete reaproveitada.
Morador de Nova York desde 1993, onde mantém um ateliê de moda e decoração, enfatiza a necessidade de um ciclo consciente de produção de qualquer produto.
Com uma bagagem cultural variada e inspirações influenciadas principalmente pelo seu país de origem, Júlio aposta em criações coloridas para se destacar no exterior.
Nesta entrevista, ele revela os prós e contras da moda sustentável, seus materiais ecológicos preferidos, o que pensa sobre a relação cada vez mais estreita entre moda e decoração, entre outros assuntos.
UseFashion - Como foi sua trajetória pelo mundo da moda?
Júlio César - Desde criança estive envolvido com as artes. Morei com uns amigos na minha cidade natal e os pais deles eram constureiros, então aprendi muito sem perceber. Eles sempre pediam para a gente comprar linha, tecido e coisas do tipo, não sabia que ali mesmo começara a minha escola de moda. Aprendi muito com eles.
Quando fui morar em Londres por 2 anos para estudar inglês, trabalhava em um restaurante, como todo imigrante faz. Certa noite, eles tinham uma festa de Dia das Bruxas, então cada funcionário tinha que escolher uma fantasia e eu era o Drácula.
Como não tinha dinheiro para comprar a fantasia, decidi fazer eu mesmo. Comprei o tecido e por falta de máquina, grampeei tudinho, imaginei que cada grampo fosse como 2 pontos de costura, e a fantasia fez o maior sucesso, ninguém acreditou quando falei que era tudo grampeado.
Quando vim morar nos Estados Unidos, fui direto para o FIT (Fashion Institute of Tecnology), para estudar modelagem. Pouco depois, fui trabalhar em uma companhia holandesa fazendo patchwork.
UF - Você é o 1º estilista a adotar o Sonic Fabric. De onde surgiu esta ideia e qual seu objetivo com estas peças?
JC - Alyce Santoro, criadora do Sonic Fabric, é uma amiga minha e anos atrás me falou do projeto, queria a minha ajuda para estudar as possibilidades de uso deste tecido, então fiz meu 1º trabalho, um banquinho para piano.
Fiz vários protótipos, como jaquetas, bandeiras e bolsas, tudo era parte do estudo do tecido. Há 2 anos, a companhia Desingtex, que tem direito à produção do tecido, me convidou para um projeto em que iriam promover o SF. Foi então que criei os itens de moda, como gravatas, bolsas, jaquetas e coletes.
UF - Quem quer criar coleções sustentáveis já encontra uma boa variedade de materiais para trabalhar ou as opções são restritas?
JC - Já existem materiais disponíveis sim, mas confesso que, comercialmente falando, fazer uma coleção só com este tipo de matéria-prima é mais difícil. O público pode não entender.
UF - Dentre os tecidos e materiais sustentáveis, quais são seus preferidos?
JC - Adoro trabalhar com o Sonic Fabric pelo visual elegante que ele tem. Gosto também do Fleece, tecido feito com garrafas Pet, pelo conforto que ele proporciona, muito parecido com o toque de um Kashmir, um luxo.
UF - Quais as maiores dificuldades em adotar materiais sustentáveis?
JC - Não vejo dificuldades em usar estes materiais. Acredito ser cada vez mais importante estimular as pessoas a mudarem de atitude, o que exige dedicação, tanto que tento fazer isso com meus trabalhos. Minha única ressalva é que considero mais fácil lidar com esta matéria-prima em países emergentes. Por razões econômicas, as pessoas são menos consumistas e levam mais aspectos em consideração antes de gastar. Em países mais ricos, as pessoas não pensam muito na hora de comprar.
UF - Além da ecologia, o que mais você gostaria de inspirar nas pessoas que conhecem seu trabalho?
JC - Sentimento de alegria e reflexão. Meu trabalho me dá prazer e quando ele inspira alegria ou curiosidade em alguém, me sinto totalmente recompensado.
UF - Acredita que artigos de decoração e moda dialogam? Como se dá este processo para você?
JC - Sim, é uma outra forma de se expressar. Decoração e moda possuem atributos semelhantes, como forma, cor, textura, etc, assim uma e outra interagem. O artista é sempre provocado pelos seus sentidos, imagino que este seja um dos aspectos que fazem esta conexão entre moda e decoração.
Grandes marcas de moda têm coleções de decoração para o lar. Ralph Lauren, por exemplo, lança coleções para a casa e moda com a mesma frequência, com tecidos bem parecidos. No meu caso, preciso explorar, descobrir novas possibilidades.
Fiz uma coleção de casacos apenas usando tecidos para decoração do lar: sofás, cortinas, etc. Ela está em exposição no HD Expo, em Las Vegas. Foi a convite da Desingtex e foi um sucesso. Alguns tecidos eram mais difíceis de manipular por causa do peso, mas os casacos ficaram lindos. Em um diálogo inverso entre as áreas, gosto de usar kimonos para fazer travesseiros. Eles ficam lindos, exóticos e superluxuosos.
UF - Você é um brasileiro de Mossoró, que já viveu em Londres e agora está nos Estados Unidos. Como essa pluralidade cultural influencia suas criações?
JC - Influencia muito, as cores da cultura do nosso país são maravilhosas e eu coloco tudo isso nas minhas criações. Morando numa cidade como Nova York, todo estilista tende a fazer tudo meio que cinza, preto e tons sóbrios mas, se você olhar o que faço, é tudo muito colorido. As pessoas aqui acham isso original e alegre, sou 100% inspirado pela cultura brasileira.
UF - Quais são seus próximos projetos? Tem algum outro material sustentável em vista para utilizar?
JC - O próximo projeto, acredito, é o mais ambicioso até agora. Estou abrindo uma companhia em São José de Mipibu, pertinho de Natal. Lá, pretendo fazer minhas coleções que serão vendidas aqui e no Brasil. Adoro o Nordeste, encontrei vários artesãos que trabalham com Capim Dourado e produtos da terra, materiais que certamente estarão em minhas coleções.
Fonte: http://www.usefashion.com/categorias/noticias.aspx?IdNoticia=89076
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um abraço,
jo